Delineando

dezembro 4, 2011

Filed under: Literalmente — delineando @ 6:45 pm

o amor é uma espera
e a dor
a ruptura súbita e imprevisível
dessa espera.

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(J. – D. Nasio, epígrafe – o livro da Dor e do Amor)

agosto 12, 2011

Filed under: coruja — delineando @ 5:44 pm

Os homens esqueceram a sua atenção em casa. Os homens esqueceram em casa a leitura que podiam do mundo. A leitura, o mundo, em casa, guardados entre farrapos e condenados a este sem uso e sem motivo. O narrador está calado. Silencioso no cuidado de si. Calado. De olhos fitos no vazio de alguma paisagem. É imagem. Calado. Outro fosse, e ele teria de se haver com esta palavra sem posse, e sem razão. Mas hoje, a narratividade é uma colheita árdua de pó, poeira e dendritos do mundo, e seus vestígios na história.
Hoje e amanhã são suspeitas sem solo, e sem espécie. Como pratarias sem valor. O conteúdo do tempo é uma mercadoria sem preço e sem demanda. Estamos esquecidos. Agentes desse esquecimento sem futuro, e sem volta. Somos esquecedores. Efêmeros, instantâneos. Nada de que possa o vocabulário de sedução e de conquista do narrador. Em silêncio catatônico, ele olha. Se rende. A pergunta que resta é pouca. A voz rouca. O peito pesado.

junho 23, 2011

Filed under: coruja — delineando @ 2:39 am

E que culpa tenho eu da cara silenciosa e constrangida dos homens? Não se pode guardar todos no coração. O mundo não tem problemas, nem soluções, muito menos miséria, quando você não menstrua. É absurdo pensar em crises existenciais quando se tem um filho para amamentar. Depois de um ano e seis meses o sangue desceu. e com ele a consciência de que de sangue também sou feita. Mas isso precisa ser me mostrado com tanta brutalidade? Como se eu não soubesse que minhas veias e artérias pulsam. Um ser humano tem por direito de nascença poder dormir em paz – afinal, ele é jogado na rua sem explicações. Esse é o nosso digno lugar-comum. Onde nos entendemos atentos, para além das palavras. Esse lugar, antes da ordem e antes do nome: nós somos…desamparados. Mas precisamos fazer disso um auto-martírio? precisamos. As coisas não são assim tão perigosas e o mundo não termina amanhã. O medo confundiu o desejo com a realidade. E a verdade é que morremos, sozinhos, com dor, com sangue, nossa carne apodrece e fede, os vermes nos comem, deixamos nossas coisas e nossas conquistas. Equiparados ao lodo, somos o nada e dele nos alimentamos. E eu farei de tudo para que me amem. Roubarei, matarei, enganarei, simularei, tudo, e tudo para que você não me olhe como um cão jogado a sarjeta. Porque o mundo é osso e a agressividade é minha vida animal. Mas por deus!, muito antes de sabermos os cães se amavam e lambiam os seus filhotes. É preciso confiar, temos fortes instintos, além do mais: unhas e dentes.

março 29, 2011

Filed under: Literalmente — delineando @ 1:11 pm

Conseguirei algum dia parar de viver? ai de mim, que tanto morro. Sigo o torduoso caminho das raízes rebentando a terra, tenho por dom a paixão, na queimada de tronco seco contorço-me às labaredas. – C.L, em agua viva.

agosto 19, 2010

Filed under: Literalmente — delineando @ 1:57 am

Quem esvazia o verso escapa do ser como certeza, encontra a ausência dos deuses, vive na intimidade dessa ausência, torna-se responsável por ela, assume o risco dela, suporta seu favor. Quem esvazia o verso deve renunciar a qualquer ídolo, deve cortar com tudo, não ter a verdade como horizonte, nem o futuro como morada, pois não tem nenhum direito à esperança: pois lhe será preciso, ao contrário, desesperar.

(Maurice Blanchot)

junho 23, 2010

Na latência das coisas.

Filed under: coruja — delineando @ 4:29 am

As paredes são brancas, nada me dizem. O chão não tem terra, não respira – só piso, sem passos. E agente trabalha pra viver ou vive pra trabalhar? Não, não quero assim. É tão difícil viver. Não faz sentido. Se pergunto como vai tua semana você me responde: corrida. Mas corrida pra onde? Agente corre pra competir. Agente compete por maior grau de desamparo. Minha louça está suja faz uma semana. Faz uma semana que não lavo as roupas sujas e nem águo as plantas. Pra que? Rodar em círculos me deixa tonta, então pra que? Desistir talvez seja o maior ato de coragem, talvez não.

Quando a vida é real demais para se ter esperanças. Quando já não importa o que vou comer ou cozinhar no almoço… alguém sussurra no meu ouvido: “é possível. É com fé que se vive”. Fé em que? Na própria fé, já dizia Lispector, que pode ser um grande susto. Pode significar cair no abismo. Mas é preciso cair no abismo, sem saber e viver, ter fé. Minha avó tem três filhos de sangue, cinco de criação e a humanidade inteira para acalentar. Possuía sua humanidade no útero e sua existência nos seios, de onde todo amparo era possível. Me dizia: “é com fé que se vive” enquanto cuidadosamente plantava suas rosas. De suas entranhas sangrava vida, pulsava esperanças, fertilidade. Ela plantava rosas. Cuidava delas como alguém que tem certeza. Ela tinha. Oitenta e um anos de dor eram o bastante para se ter as certezas necessárias. Como mais uma de suas crias eu comia de sua comida, bebia seu café doce e ouvia suas histórias, cotidianamente. Mas precisei desses meus sete meses para compreender a responsabilidade de ter fé. Desse impulso que escorria por todos os cantos de sua casa. Do impulso que saltava em sua fala e adubada toda terra. Ter fé em ser, em estar sendo e saber que a nossa beleza maior nos escapa. Ser elo de ligação do pacto secreto e silencioso da humanidade. Transformar verbo em carne, sem saber verbalizar a mágica. É quando a fé no real transborda o real e se pode sorrir contente, pois, seu ventre aponta a existência do futuro e grita o possível. Ter fé é se saber na latência das coisas…

maio 20, 2010

“na maçã da luxúria, pra que?”

Filed under: Literalmente — delineando @ 1:47 am

janeiro 19, 2010

Filed under: coruja — delineando @ 5:00 pm

não há como achar um caminho na própria vida sem responder a algumas perguntas. O que é…sua dignidade, sua responsabilidade moral e,o que é o ser humano? É preciso sentir a dor desses questionamentos e a náusea da construção das respostas. Sem isso, você acaba seguindo uma vida que não é sua, um caminho não construído por você e assim, tem uma tremenda falta de respeito consigo mesmo e, consequentemente, com as pessoas a sua volta.
ontem mesmo eu podia sentir uma casca em volta de mim se quebrando, não sem dor, não sem sangue, não sem luto. com alguns desses questionamentos uma parte de mim – talvez a única que pode ser chamada de “minha” – começou a crescer e crescer e foi então que, as rachaduras estalaram.
É inevitável que, ao sentir-se alheia a si, estando tão apropriada de si, algumas coisas e pessoas tornem-se insuportáveis – principalmente as coisas burocráticas e as pessoas defensivamente efusivas, aquelas que gritam jargões morais e éticos e são incapazes de um ato, apenas um ato, que toque na própria ausência. Ando evitando essas pessoas e coisas. ambos te violentam na “imparcialidade” que os caracteriza, na frieza revestida, escondida.
Quando se vê a olho nu a morte da inocência, quando se sente o cheiro podre de nossos próprios odores (consequencias de sentir o peso de estar vivo) se capta ao longe as pessoas que te(se) desrespeitam. que colam, como parasitas, no futuro do outro. que sofrem a negação do próprio sofrimento: ando evitando, não sem dor, não sem sangue, não sem luto

novembro 27, 2009

Filed under: coruja — delineando @ 1:31 am

Hoje toquei nas vergonhas do dia
Alisei as curvas do tempo
Sussurrei ao vento libidinosas histórias
sobre como despir-se de si mesmo.

Com os pés na grama me entreguei
a umidade da terra, ao calor
que a tudo movimenta
pulsão e vibração
vinha de fora toda respiração
que ressoava dentro de mim

E gozei de estranho pudor
quando me vi sendo parte disso tudo.

…mas ínfima era a parte.
Meu tamanho era um elefante
Desenhado numa noz.

O mundo é vulgar
e nada nos redime de nada podermos fazer.
(de tão altar o céu traqueja a todo momento
a nossa limitação).
E como amante ressentida
Dá tapas de dor depois
dos nossos ataques defensivos.
É quando os dedos se fincam no chão.

novembro 9, 2009

Filed under: coruja — delineando @ 1:34 am

Tudo está cheio daquele nada absurdamente nauseante. Ao balanço do tiquetaquear do silêncio – que, voraz, devora o tempo – viveu prazeres íntimos: sôfregos refúgios de quem não vive. Era seu estranho jeito de pertencimento no mundo. Como o estranho jeito de todos os seres humanos que, medíocres, acreditam que a profundidade é característica somente do seu ser, uma vez que o outro é sempre figura plana, carimbada e previsível.

Tudo está vazio daquele cheio absurdamente nauseante. E regurgitava reclamações sobre suas companhias fúteis. Reclamações tão superficiais que cumpriam exatamente a função que lhes cabe numa manhã de domingo: lidar com o tempo, com a solidão dos minutos sentidos.

Está vazio, tudo. Com náusea ela sentida que perdia tempo com as pessoas. Decidida, proclamou aproveitar mais seus prazeres solitários. Ninguém a compreenderia, tanto fazia. Ninguém vivia como ela.

Voraz, seu tempo devorava até mesmo a si mesmo.

(coruja)

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